A Velha Tômbola: Pinos e Cambalhotas de um Reconhecido Artista
Em 1977 - note-se: há precisamente 28 anos! - escrevia Claude Bourdet*:
Premonitório... ou muito mais que isso.
*BOURDET, Claude, A Farsa da Europa, ed. forja, 1978, p.p. 55, 56
Cão
Conta-se que certa vez, Alexandre, o Grande, se deparou com Diógenes na rua e lhe disse: “Eu sou Alexandre, o grande rei”. Ao que Diógenes lhe respondeu: “E eu sou Diógenes, o cão”.
Premonitório... ou muito mais que isso.
*BOURDET, Claude, A Farsa da Europa, ed. forja, 1978, p.p. 55, 56
Cão
obrigar o PS, PSD e PP, em cerca de 3 semanas, a mudar radicalmente de posição e a admitir o princípio do referendo de tratados que visem a construção e o aprofundamento da União Europeia. Já não é mau"
Fernando Rosas
no debate sobre a "revisão constitucional": uma trapalhada desprestigiante!
Sven Tarp (PC da Dinamarca):
"A oposição ao Tratado Constitucional é, em sua essência, uma oposição de classe, o que demonstra com toda a clareza o NÃO francês que é um NÃO operário, popular e jovem. Esse caráter de classe da oposição é saudável e lógico, levando em consideração que a mesma constituição representa os interesses estratégicos de classe da ala dominante de grande burguesia financeira e monopolista da Europa" (...)
"Em termos gerais e a longo prazo, só existem duas saídas para o atual impasse:
* Ou a grande burguesia consegue impor seu projeto, depois de um período de "reflexão" (que na verdade será de pressão), por meio do atual texto do Tratado ou outro texto revisado, o que significaria uma derrota histórica para as classes populares e a anulação da maioria dos direitos sociais e democráticos conquistados ao longo dos últimos séculos e especialmente nos anos pós-Segunda Guerra Mundial;
* Ou as classes populares conseguem impor uma agenda alternativa, que não somente repudie qualquer futuro Tratado mas também rompa com a lógica do mesmo projeto europeu do grande capital".
o artigo completo: Aqui
"Mais uma vez, ao dizer «não» de forma retumbante, no passado dia 29 de Maio, ao Projecto de Tratado Constitucional para a Europa, a França rebelde mostrou-se digna da sua tradição de «nação política por excelência». Com isso abalou o Velho Continente, suscitando de novo a esperança dos povos e a inquietação das elites estabelecidas. Reatou com a sua «missão histórica» ao mostrar, pela acção audaciosa dos seus cidadãos, que é possível escapar à fatalidade e à pesada inércia dos determinismos económicos ou políticos.
Porque este «não» tem um significado central: ele assinala um corte na pretensão ultraliberal de impor, no mundo inteiro e em desprezo dos cidadãos, um único modelo económico – aquele que o dogma da globalização define.
Este modelo já tinha suscitado, em meados da década de 1990, diversas resistências. Por exemplo, aquando do grande movimento social ocorrido em França em Novembro de 1995. Ou em Seattle (1999), onde nasceu aquilo que mais tarde – sobretudo após o primeiro Fórum Social mundial de Porto Alegre (2001), seguido dos acontecimentos de Génova (2001) – se irá chamar «movimento alterglobalista». E também em diversos Estados, da Argentina à Índia, passando pelo Brasil. Mas é a primeira vez que num país do Norte e no contexto duma consulta política institucional, uma sociedade tem oportunidade de dizer oficialmente «não» à globalização ultraliberal.
Os editorialistas dos media dominantes, quais entomologistas debruçados sobre um insecto que julgavam ter desaparecido, tentam desfigurar o «não» maciço da França.
Após terem feito uma campanha unilateral pelo «sim» denunciando o «populismo», a «demagogia», a «xenofobia», o «masoquismo», etc. dos seus adversários, quase todos eles se revelam incapazes de adaptar as suas análises à amplitude da sua derrota. Extraordinária presunção de notáveis que não compreendem – e ainda menos suportam - que o povo (palavra que só empregam pondo os dedos no nariz) se tenha recusado a alinhar pelos ditames do «círculo da razão» europeísta. Porque de facto foi o povo que voltou a trilhar o caminho do voto, tendo-se registado apenas 30 por cento de abstenções, contra 57 por cento há apenas um ano, por ocasião das eleições para o Parlamento Europeu.
Esta mobilização, em especial nas camadas populares e também entre os jovens, a respeito de um tema árido – um texto de 448 artigos, sem contar os anexos, declarações e protocolos -, constitui por si só um inesperado êxito para a democracia. O povo voltou em cheio: ante a sensação de desapossamento, exprimiu a sua vontade de uma nova apropriação.
A construção comunitária, desde os seus começos em 1958, e sobretudo desde o Acto Único Europeu de 1986, tem exercido sobre todas as decisões nacionais um crescente constrangimento. O Tratado de Maastricht (1992) e posteriormente o Pacto dito de Estabilidade e Crescimento (1997) retiraram aos governos duas das mais importantes alavancas da acção pública: a política monetária e a política orçamental. A terceira, a política fiscal, é cada vez menos autónoma, inscrevendo-se numa lógica generalizada de «concorrência livre e não falseada».
Os cidadãos compreenderam que o Tratado submetido à sua aprovação «constitucionalizava», à escala europeia, a concorrência exacerbada, não apenas entre os produtores de bens e de serviços mas também entre todos os sistemas sociais, abocanhados numa espiral descendente. Não eram por certo os muitos medíocres «progressos» democráticos do Tratado que podiam contrabalançar o bloqueamento do modelo ultraliberal que ele induzia, tirando assim todo o significado às futuras consultas eleitorais.
O «não» foi um voto extremamente informado, graças a milhares de encontros, debates e leituras, tendo figurado os livros sobre a Constituição, durante meses, nos primeiros lugares dos êxitos de vendas. Face à propaganda de Estado, secundada pela maior parte dos media, os cidadãos quiseram ter a sua própria opinião, nisso ajudados pelo incansável trabalho levado a cabo no terreno pelos múltiplos colectivos que espontaneamente se criaram em toda a França, em particular os comités locais da associação ATTAC, numa abundância de iniciativas que se mostrou digna da democracia…
Terá este voto sido nacionalista? Não, foi maioritariamente pró-europeu. A este respeito não se enganaram os sindicalistas e militantes associativos de numerosos países da União que no seu próprio terreno ou através da sua participação na campanha em França se mostraram solidários com a aspiração a uma outra Europa, expressa pelas forças vivas do «não». Privados de referendo, muitos europeus pediram aos franceses que formulassem em seu nome um voto por procuração!
Fora de França, houve quem interpretasse este «não» como um enfraquecimento da Europa face aos Estados Unidos, deixando a grande potência sem um contrapeso. Enganam-se porém os que assim pensam, porque a Constituição teria levado a União a alinhar ainda mais (em particular no plano militar) por Washington.
Está criada uma nova situação, permitindo que se proceda a uma revisão geral dos valores e das regras relativos à vontade de se viver em comum na Europa. Esta vontade não poderá reduzir-se ao seu grau zero, o da liberdade de circulação dos capitais, dos bens, dos serviços, e até das pessoas. Deste ponto de vista, o «não» de 29 de Maio não fecha nenhuma porta. Em contrapartida, torna possíveis todas as esperanças."
RAMONET, Ignacio, “Esperanças”, Le Monde Diplomatique, nº75, 2005, p.1.
CÃO DE GUARDA
Esta é simplesmente incomentável. Aqui o político revela a sua vera maestria barroca na modelagem conceptual.
"A União empenha-se no desenvolvimento sustentável da Europa, assente (...) numa economia social de mercado altamente competitiva" (Parte I, Título I, Artigo I-3.º, 3)
Parece-me que vai sendo tempo de os defensores do "sim" se decidirem. É que quando lhes convém falam-nos de um Tratado, sem mais nem menos poderes vinculativos que todos os anteriores - nesta linha de argumentação os defensores do "não" são uns temerosos alarmistas, porque a ratificação deste "grande compromisso europeu", o tal que não é o melhor, mas o melhor possível (numa moderna versão do Cândido de Voltaire), a sua ratificação, dizíamos, não submeteria - constitucionalmente - os diversos estados europeus ao cumprimento das mesmas directivas, nomeadamente, a sua submissão ao modelo socio-económico neo-liberal e rígido cumprimento do pacto de estabilidade.
Por outro lado, contudo, quando lhes dá jeito proclamam o interesse de uma europa confinada a uma única constituição.
Em que ficamos, afinal?
O Cão
Já se tornou regra os defensores do SIM repetirem constantemente que os defensores do NÃO são-no por razões muito distintas, sendo impossível encontrar qualquer ponto de contacto, de consenso, entre uma maioria clara dos defensores do NÃO. Isto é obviamente falso, para além de escamotear o facto de haver imensas diferenças entre os defensores do SIM: aqueles que querem uma UE-potência contra os EUA vs. os que querem uma UE subordinada aos EUA; aqueles que querem uma UE mais social vs. uma UE mais neoliberal. A extensão do SIM vai desde Mário Soares a Paulo Portas.....
Que consenso mínimo seria então possível de encontrar entre uma grande maioria dos defensores do NÃO nos vários países que compõem a UE, e que abrangeria inclusivé uma grande parte dos defensores do SIM?...
Subsidiariedade, Transparência, Democracia.
Subsidiariedade: as decisões devem ser tomadas o mais localmente possível, o mais próximo possível dos cidadãos.
Transparência: todo o processo de funcionamento da UE, em particular todo o ciclo (desde o início) associado à tomada de uma decisão na UE, deve ser tornado transparente de modo a que qualquer cidadão da UE possa ter toda a informação relevante para compreender o que se está a passar e porquê, de modo a que possa intervir e dar a sua opinião a cada passo.
Democracia: poderes acrescidos de decisão devem ser dados ao Parlamento Europeu (o que não quer dizer necessariamente passar mais competências para o nível Europeu), incluindo o poder de iniciar e aprovar legislação sem qualquer intervenção da Comissão Europeia, seguindo essa legislação de seguida para aprovação no Conselho Europeu e/ou num Senado Europeu (onde cada Estado tem igual representação, por exemplo 5 representantes); os cidadãos Europeus deverão ter a possibilidade de iniciativa legislativa, sendo o seu interlocutor directo o Parlamento Europeu.
Quais seriam as consequências disto?.... A perda de poder da Comissão Europeia, do Conselho Europeu, e de todos os lóbis que se mexem à sua volta. A perda de poder das elites que julgam que sabem o que é melhor. E por isso o acima enunciado dificilmente será alguma vez posto à discussão por iniciativa própria dos políticos.....
Pedro
Na Holanda, como era esperado, deu NÃO. 63 contra 37%.
Continuarão a servir-nos o argumentário habitual?
Também aqui não se discutiram questões ligadas ao tratado?
Seremos obrigados a manter este jogo até ao fim?
Poderemos aproveitar o tempo e a oportunidade para construir outra europa?
Rafeiro Alentejano