Depois de referendado em Espanha o Tratado para a Constituição Europeia, preparamo-nos nós portugueses para a celebração do acto, supostamente democrático. Contudo, lá, como cá, os partidos têm evitado cuidadosa e voluntariamente esclarecer as populações quanto aos reais termos deste tratado. Porquê? Um dos motivos dever-se-á ao facto de ter ficado claramente demonstrado com o ocorrido em França (cujas últimas sondagens apontam para uma clara vitória do "não") que o debate em geral e o esclarecimento público, em particular, premeiam com fortes dores de cabeça os diversos euro-governantes. Uma população informada é, sem dúvida, uma bestial maçada, um tremendo escolho, uma terrível contrariedade aos predeterminados desígnios transnacionais. Assim sendo, não há como manter as populações na mais ditosa ignorância, apostando simultaneamente na propagação do medo caso o "sim" não saia vencedor. Será o caos, uma fatalidade, em suma, o fim do mundo, dizem-nos, se tal acontecer. Não obstante, esquecem-se de nos explicar...porquê.
Apresentado genericamente como necessário (será?), ele é acima de tudo a consagração sob a forma de lei fundamental do modelo liberal-policiário que nos querem impingir.
Nesse sentido, serão aqui abordados com a frequência possível alguns dos aspectos considerados como razões que tornam necessário o NÃO.
E para que não percamos tempo, aqui vão duas:
Na terceira parte do Tratado, aquela sobre a qual o silêncio se torna mais pesado, é meticulosamente destruído o conceito de serviço público. O próprio termo é varrido do texto para dar lugar è expressão "serviços de interesse público". O que até aqui se consideravam serviços públicos, facultados pelo Estado, tornam-se serviços de interesse público; serviços nos quais temos interesse, mas que perdem o carácter obrigatório, vinculativo.
A União Europeia, conforme o artigo III-122, "zelará para que [esses serviços] funcionem segundo princípios e condições, sobretudo económicas e financeiras, que lhes permitam cumprir os seus objectivos".
Por outras palavras, o principal critério para avaliação de um serviço passará a ser não o seu carácter necessário mas a sua rentabilidade. Ora, como o serviço é apenas de interesse público e não de fornecimento obrigatório pelo Estado, o que não é rentável fecha.
O perigo está muito para além do simples favorecimento das seguradoras ou dos grupos hospitalares privados; aquilo a que hoje chamamos "serviço público" pode pura e simplesmente ser declarado ilegal.
Arrepiante? Ainda não é tarde.
Na mesma lógica, uma simples consulta a uma enciclopédia numa biblioteca pública pode tornar-se paga e bem paga ou simplesmente impossível, visto que a rede pública de bibliotecas encolherá drásticamente. A bem da cultura, naturalmente.
Aqueles que votam são também responsáveis pelas políticas dos seus eleitos, quer tenham ou não conhecimento das suas intenções.
E os que pensam poder recorrer, posteriormente à sua ratificação, a manifestações ou acções de protesto popular podem começar por se acautelar com coletes à prova de bala. Os nossos soberanos previram tudo! Assim, e de acordo com a
Explicação 3.b do artigo II do CEDH
Sobre a pena de morte, pode ler-se:
Um Estado poderá prever na sua legislação a pena de morte por actos cometidos em tempo de guerra ou de perigo eminente de guerra;
Explicação 3.a sobre execuções extrajudiciais:
A morte não se considerará infligida com infracção do presente artigo quando se produza como consequência de um recurso à força que seja absolutamente necessária:
a) Em defesa de uma pessoa contra uma agressão ilegítima
b) Para deter ou impedir a evasão de um preso ou de uma pessoa detida legalmente
c) Para reprimir, de acordo com a Lei, uma revolta ou insurreição.
Suficientemente esclarecedor... ou não?
O Cão
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